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Resenha: Voador
(André Prando, 2018)

 

Com o aguardado VOADOR, André Prando avança léguas rumo à maturidade artística e apresenta um trabalho ambicioso de contornos surpreendentes e dinamismo admirável no processo. (Fotos: Bernardo Firme / Divulgação)


Após despontar no circuito musical capixaba e se firmar como um nome referencial em seu estado por conta de sua voz potente, sonoridade híbrida (devidamente registrada no EP Vão e no ótimo Estranho Sutil) e performances altamente energéticas, o cantor e compositor André Prando se viu diante do árduo desafio de realizar o temido segundo disco e conciliar os riscos inerentes à retomada de elementos consolidados (correndo o risco de soar repetitivo) com a busca por inovação (correndo o risco de alienar o ouvinte). Tendo encontrado o caminho da síntese, o músico retorna após três anos com VOADOR, trabalho que dá sequência às linhas temáticas e sonoras deixadas por seu predecessor com força irrefutável e abre um vasto leque de possibilidades para seu autor de forma arrebatadora e extremamente cativante.

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Produzido por Henrique Paoli (My Magical Glowing Lens, Ana Muller e Fernando Zorzal) ao lado de JR Tostoi (Lenine, Ana Carolina, Caetano Veloso) e viabilizado por meio de uma campanha bem-sucedida de crowdfunding, Voador representa um salto evolutivo substancial tanto em termos líricos quanto sonoros: Da abertura (a apoteótica Ode à Nudez) à faixa de encerramento (a edificante O Mundo Com Tudo o Que Há), o disco é constituído por paisagens sonoras altamente contrastantes que formam um arco abrangente de fortes ares lisérgicos e se mostram homogeneamente imbuídas com uma forte carga emocional e um senso de paixão inequívoco.



Dividido em dois grandes atos (ou lados) que se separam por um longo interlúdio (a mântrica Salve seu Brother, de Santiago Emanuel), o disco impressiona pela forma com que aprofunda em temas recorrentemente abordados por Prando (como senso de identidade, isolamento, status quo, relativismo moral e a relação com o Outro) ao mesmo passo em que amplia seu universo sonoro através duma investida ostensiva em ambientações densas que se revelam altamente imersivas e multi-niveladas. Conciliando momentos vigorosamente pulsantes (Ave Machinaria) com instantes profundamente contemplativos (Na Paz do Caos e a magnífica Fantasmas Talvez) e passagens de crueza angustiante (Catalepsia Projetiva, que se realiza plenamente em sua coda), este álbum também evidencia o amadurecimento de seu autor e sua crescente atenção ao universo que lhe cerca, equilibrando o senso de intimidade do disco com uma patente avaliação crítica do presente contexto social (vide a dylanesca Moro no Interior do Mundo e a inclusão de Eu Vi num Transe, também de Santiago Emanuel).

 

Viabilizado por meio de uma campanha bem-sucedida de crowdfunding, Voador representa um salto evolutivo substancial tanto em termos líricos quanto sonoros: Da abertura (a apoteótica Ode à Nudez) à faixa de encerramento (a edificante O Mundo Com Tudo o Que Há), o disco é constituído por paisagens sonoras altamente contrastantes que formam um arco abrangente de fortes ares lisérgicos e se mostram homogeneamente imbuídas com uma forte carga emocional e um senso de paixão inequívoco.

 

Registrando também uma banda de apoio reformulada, este LP é imensamente beneficiado pelo retorno de Paoli (parceiro recorrente de Prando) na bateria e pelas adições do guitarrista Philip Rios e do baixista Jackson Pinheiro (SILVA, Supercombo), os quais conferem versatilidade e potência a cada uma das faixas por conta de sua dinâmica fluida e bem-amarrada. Da mesma forma, Voador também conta com uma pletora de participações especiais que se revelam marcantes pela forma com que elevam todas as músicas nas quais acontecem a outro patamar. Dentre estas, vale ressaltar as guitarras incisivas de Gabriel Ventura (Ventre, Lenine) em Concha (a melhor do disco), a guitarrada paraense de Lucas Estrela em Eu Vi Num Transe, a suavidade do vocal de Luiz Gabriel Lopes (Graveola) em Na Paz do Caos e a performance titânica de Duda Brack na épica Em Chamas, no Chão.



Porém, é fato que o grande destaque do disco (como não poderia deixar de ser) é mesmo seu autor, o qual se reapresenta ao público com volumes de gravitas que se tornam evidentes desde os segundos iniciais de audição. Demonstrando crescimento como músico e letrista, Prando se consolida aqui como uma voz de força e intensidade inatas, transitando entre as diferentes faixas com segurança absoluta e nuance (vide a belíssima Musa dos Cetáceos), alcançando o auge com a supracitada Concha, um tour de force que projeta uma miríade de sentimentos e os cataliza numa frase profundamente dolorosa (É uma pena...) em menos de cinco minutos.



 

Intenso, expansivo e dotado dum profundo senso de espiritualidade, Voador é um trabalho ambicioso e audacioso que comprova categoricamente o talento de seu autor e serve como mais um registro contundente do nível de qualidade visto na cena musical capixaba. Mas, diferentemente de seu predecessor, este segundo registro vem provar que, agora, Prando está falando muito seriamente e quer que você ouça o que ele tem a dizer. Sendo assim, vale a pena parar para escutar com muita atenção. Escutar e aguardar ansiosamente pelo terceiro disco.

Guilherme Guio
Guilherme Guio
Publicitário por formação, especialista em Comunicação Corporativa e Inteligência de Mercado, é o editor e redator principal do RTC. Atuando como consultor de Marketing Cultural, resolveu dar vazão aos seus arroubos verborrágicos através deste projeto. Também é tabagista compulsivo, cinéfilo inveterado, adepto de audiófilo e dançarino amador vergonhoso nas horas vagas.

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