O senso de Identidade e a ideia da Conexão Humana são conceitos caros a André Prando. De modo geral, é possível afirmar que a busca por um lócus existencial e a auto-diagramação no contexto da relação com Outro(s) sempre foram tema centrais em suas composições, permeando seus dois registros (o EP Vão e o ótimo Estranho Sutil) e podendo ser percebidos em faixas como Linha Torta, O Verme Ama, O Brother, Vestido Cor Maçã e até mesmo Amiga Vagabunda e Circo dos Palhaços Dixavadamente Imorais. Sendo assim, ainda que não seja exatamente surpreendente perceber que estes temas retornam com força em sua construção artística, não deixa de ser profundamente fascinante notar como são explorados e retratados no clipe de Ode à Nudez, faixa de abertura do disco Voador.
Podendo ser descrito como uma viagem rumo à auto-descoberta e ao diálogo com outros universos subjetivos com um trajeto marcado pela iconoclasia e pela desconstrução (simbólica e interna) de si, Ode à Nudez representa um salto em termos de ambição, sensibilidade e maturidade para seu autor. Imbuído de um espírito solene e edificante, o clipe realiza uma simbiose admirável entre imagem e som, conseguindo representar visualmente o sentimento contido na letra de Prando ao mesmo passo em que contrapõe de forma hábil o dinamismo da faixa com a suavidade do que é visto e ainda imbui certas passagens com camadas adicionais de leituras (vide aquela que diz Eu me sinto incrível / Eu pareço você / Eu me sinto você). E o fato desta tapeçaria audiovisual formar uma construção que se revela pulsante, intimista e plurissignificativa em medidas equivalentes é digno de nota por si só.
Dirigido por Diego Locatelli e fotografado por Felipe Amarelo, o clipe emprega uma abordagem minuciosa repleta de takes em slow motion para estabelecer um clima etéreo que é constantemente acentuado pelo magnetismo da faixa e pelas coreografias catárticas de Gabriela Moriondo numa composição que explora ao máximo o conceito de linguagem corporal e garante o maior impacto visual para cada plano colocado na tela. O resultado final é uma obra que soa como um cruzamento altamente arrojado entre o naturalismo de Terrence Malick, a metafísica contemplativa de Andrei Tarkovsky e o apuro estético de Tarsem Singh.
Imersivo, altamente reflexivo e dotado de uma beleza plástica avassaladora, Ode à Nudez representa tanto uma comprovação do talento de Prando como simboliza um avanço substancial em sua trajetória rumo ao crescimento artístico e profissional e à exploração de seu vasto potencial. Sendo parte da incrível onda de clipes de artistas regionais que tem se desenrolado neste ano, esta obra figura ao lado de Lazarus (clipe de David Bowie) como uma daquelas obras marcantes que não apenas representam uma ideia com excelência, mas retratam um momento substancial na história pessoal de seus autores. Prando cruzou sua porta e nos convidou a seguirmos com ele. E, a julgar por este convite, esta me parece uma proposta irrecusável.